Empregadas domésticas e diaristas têm tido que negociar seus regimes de trabalho e a remuneração que recebem durante o período de isolamento social, medida adotada pelo governo para evitar a proliferação do coronavírus.
Rosa é uma das profissionais que vem enfrentando dificuldades durante o isolamento social. Ela trabalhava como diarista em quatro casas, entretanto, com a quarentena ela foi dispensada por todos os patrões que pararam de pagar as diárias.
“Eu não tenho falado com eles [patrões], porque eles estão isolados, eles só mandam mensagens falando ‘se cuida, que a gente também está se cuidando’, mas eles não perguntam se a gente tem comida na panela. É difícil, é muito difícil”, disse Rosa.
A diarista sustenta sozinha uma família de sete pessoas e conta que tem sobrevivido com poucos alimentos e com o auxílio de doações.
“Mês passado a gente pagou aluguel porque minha filha recebeu a última parcela do seguro desemprego, esse mês já não tem mais, então, eu já não sei como que vai ser, tudo estava dependendo de mim”, conta Rosa.
Uma empregada doméstica, que não quis se identificar, conta que é hipertensa e está grávida de 5 meses. Ela decidiu ficar em casa mesmo contra a vontade dos patrões.
“Eu estou grávida de cinco meses e eu preferi proteger meu bebê que não tem culpa de nada. Eu prefiro a minha saúde porque muitos estão perdendo a vida. Essa aqui é minha caderneta de gestante, do pré-natal. Na quarta-feira que vem eu tenho consulta. A médica vem me atender em casa, porque eu não consigo ir à UBS.”
A empregada doméstica decidiu ficar em casa desde o dia 17 de março e até agora não recebeu o pagamento referente a primeira quinzena do mês. Ela trabalhava na mesma residência há 9 anos.
“Não me pagou, não ligou para saber se eu estou precisando de alguma coisa ou não”, relata ela. “Eu pensava que não ia passar por isso por estar em um trabalho há 9 anos, eu pensei que eu iria ter um pouco mais de consideração”, completa.
Campanha na internet
Filhos e filhas de empregadas domésticas e diaristas fizeram um manifesto na internet pedindo aos patrões para que as mães pudessem ficar em quarentena sendo remuneradas.
“As empregadas domésticas pertencem a uma categoria de trabalhadoras que representam o Brasil, há anos nossas mães, avós, tias, primas dedicam duas vidas a outras famílias”, diz a carta.
Marcelo Rocha é filho de uma empregada doméstica e foi um dos idealizadores do movimento. “Parte desse lugar do manifesto é cuidar de quem sempre cuidou da gente e hoje eu acho que é um agradecimento, é uma devolução a tudo isso que essas mulheres construíram”, relata.
Auxílio do Governo Federal
O advogado, especialista em direito do trabalho, Décio Daidone Júnior defende que a atividade doméstica não entra na lista de atividades consideradas essenciais, por isso, a ida das profissionais ao trabalho deve ser negociada.
“A obrigação de mandar a empregada trabalhar é algo que não cabe nesse momento, a gente entende que o trabalho doméstico não é considerado um serviço essencial, então, não há a necessidade, a obrigação primária, desse trabalho ser executado. Com algumas exceções, obviamente, aquele empregado doméstico que cuida de um idoso, que cuida de alguém que precisa de um cuidado permanente, esse sim, precisa continuar trabalhando, mas todos os demais, como não é uma atividade essencial, e a gente tem que pensar no distanciamento social, pensar no isolamento, na promoção da saúde, então, para esses casos a recomendação mesmo é que se permaneça em casa, aguarda passar por todo esse momento para depois retomar esse seu trabalho”, disse Décio.
Algumas medidas tomadas pelo Governo Federal podem auxiliar na negociação entre patrões e empregados para que não ocorra o atraso ou suspensão do pagamento.
“É um momento de bom sendo, de conversa, então, o patrão não pode simplesmente falar, ‘olha não vou te pagar mais nada’ e fica por isso mesmo. Nesse caso, há até a possibilidade dessa empregada buscar a justiça e entender que houve uma falta grave cometida pelo seu empregador pela falta de pagamento de salários dela, mas a gente sabe também que buscar a justiça em um momento desse é muito complicado está tudo parado e tudo mais, então, é realmente chegar em um bom senso”, diz Décio.
Há duas opções de ações que podem ser tomadas pelos patrões para salários de até R$ 3.135: cortes de 25, 50 e 70%; e suspensão temporária do contrato. No caso dos cortes se o salário for de R$ 1.300, por exemplo, e o corte de 50% do salário e da jornada, a empregada doméstica recebe R$ 650 e o governo complementa com R$ 522 equivalente a 50%, com o valor do seguro desemprego, o salário fica R$ 1.172, o acordo pode durar até 90 dias. O empregador também pode optar pela suspensão temporária do contrato, neste caso, a doméstica não trabalha e recebe por dois meses R$ 1045, que serão pagos integralmente pelo Governo Federal.
O advogado Décio Daidone Júnior esclarece que o procedimento é simples e quem deve acionar o Governo Federal é o empregador.
“O patrão é quem deve tomar a inciativa. Isso é muito fácil, ele entra no site do governo, no site do Ministério do Trabalho e emprego e lá ele vai fazer essa escolha entre fazer a suspensão do contrato ou fazer a redução da jornada com a redução do salário. Então, é o empregador que vai se movimentar para fazer isso. Agora, é importante que você diga que isso é um acordo individual entre empregado e empregador, então, há a vontade das duas partes em jogo, então precisa coincidir essas duas vontades. A gente entende que em um momento como esse, não há motivo que esse acordo não seja feito, porque o empregador ele também pode estar sofrendo uma perda grande na sua renda. Então, se ele não tem entrada de dinheiro ele não consegue repassar o dinheiro, então, no caso a importância da medida provisória que traz essa possibilidade”, disse Décio.
Janaína Mariano de Souza, presidente do Sindicato das Empregadas domésticas da Grande São Paulo, relata que as medidas adotadas pelo Governo Federal ajudaram na redução do número de demissões.
“Ela veio para dar uma desafogada mesmo no que estava ocorrendo. Os empregadores não sabiam o que poderia ser feito, então, eles estavam efetuando a dispensa aí com a nova medida eles estão fazendo agora a suspensão de contrato, suspensão e a redução também. Semana passada quando foi o boom que começou tudo a gente chegou a receber 150 a 200 no dia acordos”, conta Janaína.
No caso das diaristas que não possuem carteira assinada, o advogado recomenda que, caso os patrões suspendam os pagamento das diárias elas podem recorrer ao auxílio pago pelo Governo Federal aos trabalhadores autônomos.
“Se ela não tem carteira assinada ela não entra nesses pressupostos aqui da medida provisória, mas se é uma diarista, por exemplo, ela pode ir atrás de um auxílio emergencial, então, ela também busca o site da Caixa Econômica Federal e ela também pode ter o benefício dos R$ 600 por até três meses”, afirma Décio.
Fonte : G1
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