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Incidente de Recurso Repetitivo e a periculosidade do agente socioeducativo da fundação casa

Mauricio Nahas Borges 1

O Incidente de Recurso Repetitivo se instaura perante um Tribunal quando em sua jurisdição se registram vários processos com a mesma questão de direito que possa ensejar soluções conflitantes, podendo vir a afrontar a isonomia e a segurança jurídica, tendo como objetivo garantir uma jurisprudência uniforme, estável e coerente.

O IRR (Incidente de Recurso Repetitivo) tem previsão no art. 976 do Código de Processo Civil [1] e pode ser promovido pelo juiz ou relator (por ofício), pelas partes (por petição) ou ainda pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública (por petição) [2].

Por muito tempo se discutiu perante a Justiça do Trabalho se o adicional de periculosidade previsto no §2º do art. 193 da CLT [3] se aplicaria aos agentes sócio-educativos da Fundação Casa, sendo que o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região proferiu inúmeras decisões díspares, valendo mencionar a título exemplificativo:

Exemplos de decisões favoráveis:

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. FUNDAÇÃO CASA. AGENTE DE APOIO SOCIOEDUCATIVO. O adicional previsto no artigo 193, II, da CLT, é devido ao trabalhador exposto de forma permanente a “roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”.(TRT-2 10001185520155020291 SP, Relator: DORIS RIBEIRO TORRES PRINA, Gabinete da Vice-Presidência Judicial, Data de Publicação: 10/12/2015)

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. FUNDAÇÃO CASA. AGENTE DE APOIO SOCIOEDUCATIVO. O adicional previsto no artigo 193, II, da CLT, é devido ao trabalhador exposto de forma permanente a “roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”. E, consoante previsão do caput desse artigo, houve regulamentação pela Portaria MTE nº 1.885, de 02.12.2013, que acrescentou o Anexo 3 à NR-16 para definir as atividades que devem ser enquadradas como perigosas. Na hipótese vertente, a função de Agente de Apoio Socioeducativo se amolda às de vigilante ou agente de segurança, como reconhece a própria reclamada no documento intitulado “Descrição do Cargo”, o qual estabelece, como atribuições da função, garantir as condições ideais de segurança e proteção dos profissionais e adolescentes, bem como participar da segurança externa dos Centros de Atendimento, de modo a autorizar o enquadramento na norma a partir de sua vigência e reconhecer o direito ao respectivo adicional. (TRT-2 10001491820155020601 SP, Relator: DORIS RIBEIRO TORRES PRINA, Gabinete da Vice-Presidência Judicial, Data de Publicação: 06/11/2015)

EMENTA: FUNDAÇÃO CENTRO DE ATENDIMENTO SÓCIO-EDUCATIVO AO ADOLESCENTE – FUNDAÇÃO CASA -SP. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. LEI 12.740/12. AGENTE SOCIOEDUCATIVO. DEVIDO. Consta do rol de atribuições do cargo de agente socieducativo, conforme histórico funcional, contrato de trabalho e a descrição do cargo, o acompanhamento dos adolescentes não só em suas atividades diárias mas, também, em audiências, atendimento médico/hospitalares, entre outras atividades, no campo da segurança e disciplina, determinadas por autoridade competente, de modo a garantir as condições ideais de segurança e proteção dos profissionais e adolescentes de forma ininterrupta. As tarefas elencadas se amoldam ao cargo de agente de segurança, ainda que tal nomenclatura fosse substituída pela de agente socioeducativo o que, por sua natureza ou método de trabalho, expõe a risco acentuado de violência física a reclamante, em razão de atuar em “atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”, exatamente como dispõe o dispositivo consolidado. Apelo da reclamada a que se nega provimento. (TRT-2 10013498220145020605 SP, Relator: VALDIR FLORINDO, Gabinete da Vice-Presidência Judicial, Data de Publicação: 28/04/2015)

Exemplos de decisões desfavoráveis:

Adicional de periculosidade. Agente socioeducativo. FUNDAÇÃO CASA. CLT, 193. A Lei 12.740/2012 alterou o art. 193 da CLT para estender o adicional de periculosidade aos trabalhadores sujeitos a roubo e violência, nas atividades profissionais de segurança pessoal e patrimonial. O agente socioeducativo da FUNDAÇÃO CASA não se enquadra nesse perfil, ainda que exerça atividade ligada à segurança. Súmula 43 deste Regional. Recurso Ordinário da ré a que se dá provimento. (TRT-2 10017417320175020069 SP, Relator: EDUARDO DE AZEVEDO SILVA, 11ª Turma – Cadeira 4, Data de Publicação: 23/04/2019)

FUNDAÇÃO CASA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. AGENTE SOCIOEDUCATIVO Conquanto tenha se evidenciado que a atividade do autor equipara-se àquelas descritas na Portaria MTE n.º 1.885 de 02 de dezembro de 2013, referida matéria está pacificada neste E. Tribunal, devendo ser aplicada a Súmula 43 deste TRT, segundo a qual “O agente de apoio socioeducativo da Fundação Casa – SP não tem direito ao adicional de periculosidade previsto no artigo 193, II, da CLT, uma vez que suas atividades laborais não se enquadram no Anexo 3, NR 16, da Portaria nº 3.214/78”. Apelo do autor improvido. (TRT-2 10016200720175020017 SP, Relator: PAULO EDUARDO VIEIRA DE OLIVEIRA, 3ª Turma – Cadeira 2, Data de Publicação: 19/02/2020)

AGENTE DE APOIO SOCIOEDUCATIVO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INDEVIDO. Nos termos da Súmula n.º 43 deste E. Regional, “o agente de apoio socioeducativo da Fundação Casa – SP não tem direito ao adicional de periculosidade previsto no artigo 193, II, da CLT, uma vez que suas atividades laborais não se enquadram no Anexo 3, NR 16, da Portaria nº 3.214/78”. Pelo provimento do recurso. (TRT-2 10011647220205020075 SP, Relator: MERCIA TOMAZINHO, 3ª Turma – Cadeira 4, Data de Publicação: 08/06/2021)

Diante da disparidade, o tema chegou ao Egrégio Tribunal Superior do Trabalho através do IRR – Processo nº 1001796-60.2014.5.02.0382 o qual, através de recente julgado, por maioria de votos, reconheceu o direito de percepção do adicional de periculosidade a partir de 2013 para os agentes de apoio socioeducativo. Eis a decisão:

Decisão:

1 – por maioria, vencidos os Ex.mos Ministros Aloysio Corrêa da Veiga, Guilherme Augusto Caputo Bastos e Alexandre Luiz Ramos, aprovar, sem modulação, tese jurídica para o Tema Repetitivo nº 16, de observância obrigatória (arts. 896-C da CLT e 927, III, do CPC e 3º, XXIII, da IN 39/2015 do TST), enunciada com o seguinte teor: “I. O Agente de Apoio Socioeducativo (nomenclatura que, a partir do Decreto nº 54.873 do Governo do Estado de São Paulo, de 06.10.2009, abarca os antigos cargos de Agente de Apoio Técnico e de Agente de Segurança) faz jus à percepção de adicional de periculosidade, considerado o exercício de atividades e operações perigosas, que implicam risco acentuado em virtude de exposição permanente a violência física no desempenho das atribuições profissionais de segurança pessoal e patrimonial em fundação pública estadual. II. Os efeitos pecuniários decorrentes do reconhecimento do direito do Agente de Apoio Socioeducativo ao adicional de periculosidade operam-se a partir da regulamentação do art. 193, II, da CLT em 03.12.2013 – data da entrada em vigor da Portaria nº 1.885/2013 do Ministério do Trabalho, que aprovou o Anexo 3 da NR-16”; 2 – por unanimidade, conhecer do recurso de embargos E-RR-1001796-60.2014.5.02.0382 do reclamante, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reconhecido o direito do Agente de Apoio Socioeducativo ao adicional de periculosidade, condenar a Fundação Casa ao pagamento do adicional de periculosidade, a partir de 03.12.2013 – data da regulamentação do inciso II do art. 193 da CLT-, no percentual de 30% (trinta por cento) sobre o salário básico (Súmula nº 191, I, do TST) e reflexos postulados na petição inicial – férias acrescidas do terço constitucional, décimo terceiros salários e depósitos do FGTS-, parcelas vencidas e vincendas, até a sua efetiva incorporação na folha de pagamento. Juros e correção monetária na forma da lei (art. 883 da CLT), observadas as Súmulas 200 e 381 do TST. Contribuições previdenciárias na forma do art. 28 da Lei 8.212/1991 e da Súmula 368 do TST. Inverte-se o ônus da sucumbência. Determinar a comunicação do presente acórdão à Presidência e aos Ministros do TST, bem como aos Desembargadores Presidentes dos Tribunais Regionais do Trabalho, para o cumprimento dos artigos 896-C, §11, da CLT, 1.039 e 1.040 do CPC/2015. Observação 1: o Ex.mo Ministro Aloysio Silva Corrêa da Veiga juntará voto vencido ao pé do acórdão. Observação 1: a Dra. Déborah Cabral Siqueira de Souza falou pela parte CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA – CNI. Observação 2: o Dr. Nei Fernando Marques Brum falou pela parte FUNDAÇÃO DE ATENDIMENTO SÓCIO-EDUCATIVO DO RIO GRANDE DO SUL – FASE. Observação 3: a Dra. Márcia Ramos dos Santos falou pela FUNDAÇÃO CENTRO DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO AO ADOLESCENTE – FUNDAÇÃO CASA/SP Observação 4: a Exma. Subprocuradora-Geral do Trabalho, Dra. Oksana Maria Dziura Boldo, manifestou-se pelo Ministério Público do Trabalho.

[1] Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:

I – efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;

II – risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

[2] Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente de tribunal:

I – pelo juiz ou relator, por ofício;

II – pelas partes, por petição;

III – pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição.

[3] Cuja caracterização das atividades ou operações perigosas foi regulamentada pela Portaria MTE 1.885/2013.

Mauricio Nahas Borges – Advogado Trabalhista

Valeria Di Fazio Galvão – Advogada Trabalhista

 

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